A incontinência urinária é a perda involuntária de urina e pode acometer homens e mulheres de todas as idades. Neste texto, concentraremos nossas atenções para a incontinência feminina, que é mais frequente.
QUANDO OPERAR?
A incontinência urinária feminina tem como principais causas o enfraquecimento do esfíncter uretral e das estruturas de sustentação da bexiga e a hiperatividade vesical. Na primeira, o sintoma típico é o de perda urinária ao fazer esforços como tossir, espirrar, correr e carregar pesos. Na segunda, a bexiga contrai de forma indesejada e prematura, levando aos sintomas de urgência para urinar e incontinência. Sabe-se que a incontinência urinária é uma condição com significativo impacto negativo na qualidade de vida da maioria das pacientes. Diferente de outras doenças urológicas como a litíase urinária, infecções e tumores, a incontinência urinária raramente representa uma ameaça à saúde física de suas portadoras, mas pode trazer importantes transtornos psicológicos e emocionais. Muitas pacientes podem se afastar do convívio familiar ou social, evitar o contato íntimo com o parceiro e ter problemas no ambiente de trabalho por causa da incontinência urinária. O constrangimento da perda de urina pode ser devastador em alguns casos, levando à depressão e isolamento social.
Existem diferentes modalidades de tratamentos para cada tipo de incontinência urinária, variando de medidas de ajuste de dieta e consumo de líquidos a exercícios de fisioterapia para o assoalho pélvico, tratamentos medicamentosos e cirurgias. De maneira geral, os tratamentos não invasivos são considerados de primeira linha, reservando-se as cirurgias para os casos em que não tiveram sucesso as medidas conservadoras.
TRATAMENTO CIRÚRGICO
As cirurgias para o tratamento da incontinência urinária de esforço passaram por uma verdadeira revolução ao longo dos últimos 20 anos. Antes, as cirurgias eram mais demoradas e traumáticas e requeriam longos períodos de recuperação, além de oferecerem taxas de sucesso bem mais modestas. Era frequente a necessidade de repetidas cirurgias pois as taxas de recorrência do problema eram muito elevadas. O avanço no conhecimento dos mecanismos causadores da incontinência urinária e a incorporação do uso de telas de materiais sintéticos bem como de melhorias na técnica cirúrgica promoveu enorme impacto nos resultados do tratamento cirúrgico da incontinência urinária. Os procedimentos tornaram-se mais simples, envolvendo menor trauma cirúrgico e permitindo mais rápida recuperação das pacientes e retorno às atividades normais mais precocemente. Associado a isto, as taxas de sucesso no tratamento da incontinência foram significantemente melhoradas, tanto no curto como no longo prazo. Uma cirurgia para o tratamento de incontinência urinária de esforço habitual representa atualmente um procedimento de menos de 1 hora de duração, com internação de um dia e oferecendo uma chance de sucesso da ordem de 80 a 90%. Estes números podem ser modificados na existência de fatores agravantes e quando são necessários procedimentos associados para o tratamento de outros problemas uroginecológicos.
Diante de resultados tão animadores e de procedimentos relativamente simples e rápidos, a questão que se impõe é “Quando a cirurgia deve ser indicada?”. A resposta para esta questão, entretanto, nem sempre é tão simples. Apesar dos significativos avanços na técnica operatória, as cirurgias para o tratamento da incontinência urinária ainda apresentam alguns riscos para as pacientes. Ainda que os riscos de complicações significativas como sangramento, lesão de órgãos pélvicos, obstrução urinária e rejeição da tela cirúrgica sejam muito baixos, representam importantes problemas médicos e seu tratamento pode requerer reoperação e determinar maiores períodos de recuperação.
A escolha do tratamento cirúrgico em mulheres com incontinência urinária deve sempre ser compartilhada entre o cirurgião e a paciente e vários aspectos devem influenciar a decisão. É claro que o correto diagnóstico da causa da incontinência é a condição inicial mais importante. Em seguida, deve-se ressaltar que os tratamentos conservadores podem ser oferecidos em quase todos os casos, e não oferecem riscos significativos. Entretanto, modalidades como a fisioterapia para o assoalho pélvico requerem o envolvimento das pacientes e frequentes sessões de fisioterapia por várias semanas ou meses, o que nem sempre é possível de ser realizado em razão do estilo de vida de cada paciente. Além disso, embora isenta de riscos, a fisioterapia pélvica oferece taxas de sucesso muito inferiores às observadas com o tratamento cirúrgico, o que também deve ser considerado na escolha do tratamento. Um importante fator que pode influenciar na escolha do tratamento é a existência de outros problemas uroginecológicos que requeiram tratamento cirúrgico. Nestes casos, os argumentos a favor da cirurgia tornam-se mais fortes, já que pode existir a necessidade de corrigir cirurgicamente outros problemas. É o caso dos prolapsos vaginais, situação na qual existe significativo enfraquecimento das estruturas de sustentação da vagina e órgãos pélvicos permitindo que ocorram protusões ou abaulamentos das paredes vaginais. Do ponto de vista do leigo, é a chamada “bexiga caída”, situação na qual a bexiga pode ficar em posição mais baixa e até abaular a parede vaginal (cistocele). O mesmo pode ocorrer com o útero (prolapso uterino) e o reto (retocele). Quando sintomáticos, estes prolapsos requerem correção cirúrgica e o tratamento concomitante da incontinência urinária está quase sempre indicado. Finalmente, um aspecto relevante na tomada de decisão é a existência de condições clínicas associadas que possam aumentar os riscos cirúrgicos e anestésicos. Pacientes que apresentam várias comorbidades clínicas graves e que por isso tenham um risco anestésico elevado devem ser primariamente tratamedas com medidas conservadoras.
Concluindo, podemos dizer que o tratamento da incontinência urinária feminina permite diferentes abordagens. As cirurgias contemporâneas para tratamento da incontinência urinária são procedimentos bem estabelecidos e proporcionam elevadas taxas de sucesso, mas não são isentas de possíveis complicações. A escolha do tratamento cirúrgico deve sempre ser compartilhada entre o cirurgião e a paciente e vários aspectos devem influenciar a decisão.